Uh-la-la, Neymar!

(Foto: Lionel Bonaventure/AFP)

Uh-la-la! Mais uma vez, a Europa se curva ante o Brasil, como no poema de Oswald de Andrade, parodiando a canção ufanista do primeiro palhaço de circo brasileiro negro, Eduardo das Neves.

A canção de Eduardo das Neves celebrava, na virada do século 19 para o 20, os feitos de Santos Dumont, circulando com seu balão dirigível a Torre Eiffel.

Oswald divertia-se com o sucesso do Clube Atlético Paulistano, do mulato Arthur Friedenreich, em campos de França nos anos 20 do século passado, quando nossos craques mereceram dos anfitriões o título de Les Rois du Foot-Ball (Os Reis do Futebol).

Isso, ao mesmo tempo em que Paris dançava o maxixe e aplaudia os Oito Batutas, conjunto de choro centrado nos seus três músicos históricos: os negros Pixinguinha, Donga e João da Baiana.

Eram os anos loucos do pós-guerra – ou, entre guerras, se o amigo preferir – quando Paris era o centro cultural do mundo. Como tal, rendia-se à arte do futebol brasileiro, expressa nos pés mágicos de Fried e Arakén Patuska, encantadora novidade em meio a um jogo mecanizado e pouco inspirado dos europeus.

Dou esse mergulho no tempo pra extrair de lá a linha cultural que nos traz à figura mais badalada do dia, o nosso Neymar, digno herdeiro de Fried e um dos raros remanescentes daquele futebol que seduziu Paris, e, mais tarde, o mundo durante décadas, configurado na história de Pelé, o maior de todos em qualquer época ou latitude.

Neymar é, sobretudo, um artista da bola, que junta a seus pés a estética surpreendente do criador, inventor de jogadas no mais puro estilo brasileiro em que se harmonizam o engenho de um Santos Dumont da pelota e os sons ao mesmo tempo nostálgicos e maliciosos do maxixe e do choro – cuja simbiose nos deu o samba mais autêntico – com a alegria de um Eduardo das Neves e a irreverência de um Oswald de Andrade, o pai do antropofagismo (doutrina literária que prega digerir os escritos estrangeiros e expelir uma literatura verdadeiramente nossa).

E só por isso Neymar passou a ser o jogador mais valioso do planeta em todos os tempos e recebido como um autêntico roi du foot-ball numa Paris em festa.

Só falta, agora, Neymar conduzir o PSG à conquista da Liga dos Campeões para que não só a Europa se curve novamente ante o Brasil, mas, também, o mundo todo, inclusive o Brasil, onde a arte se curvou nos tempos atuais ante aos reis da safadeza, da violência e da ignorância, dentro e fora dos gramados.

 

 

3 comentários

  1. Assisto, sempre que posso ao Gazeta esportiva, e pela primeira vez me aventuro a visitar “blogs” E tive a sorte e o privilégio de ler seu comentário sobre o Neymar Jr, fico feliz com a riqueza e os conhecimentos passados, por isso no programa te chamam de professor. Tenho 60 anos, e fico feliz em ler um comentário tão bem feito.
    Parabéns
    Que bom ter você a nos brindar com sabedoria.

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